Maria Christina Carvalho, de São Paulo
02/04/2009 | |
O teste de estresse mais recentemente feito pelo Banco Central (BC) nos bancos brasileiros mostra que eles estavam bem preparados para enfrentar a crise internacional.
Aplicado sobre os balanços de junho de 2008, o teste envolveu 131 bancos, com patrimônio de referência consolidado de R$ 317,4 bilhões e patrimônio de referência exigido (PRE) de R$ 207,9 bilhões. Esses bancos representavam 97% dos ativos totais do sistema financeiro e tinham um índice da Basileia médio de 16,8%. Nova avaliação foi feita em dezembro e será divulgada no próximo mês.
Em junho, o BC testou o impacto no capital dos bancos de fortes oscilações no câmbio e no juro e de uma deterioração não desprezível na carteira de crédito. Levou-se em conta que o câmbio, que era de R$ 1,59 por dólar na época, quase dobraria, chegando a R$ 3,12 e despencaria para R$ 0,81. O juro oscilou 10 pontos acima e 10 abaixo. E a carteira de crédito foi integralmente rebaixada em dois níveis de classificação, o que exigiu o aumento de 128% nas provisões.
No pior cenário possível, em que câmbio e juro subiam simultaneamente e o crédito se deteriorava, o índice da Basileia dos bancos brasileiros caiu abaixo dos 11% mas raramente ficou abaixo de 8%, que é o mínimo estabelecido internacionalmente. Até o aumento de 220% das provisões, nenhum banco ficou insolvente. Os testes revelaram que os bancos somente ficariam desenquadrados do índice de 11% exigido pelo BC brasileiro quando o aumento de provisão necessário fosse de 240%. Com um aumento de 250%, o índice caiu de 16,8% para 10,1%. Ou seja, as provisões podem mais do que triplicar sem que os bancos fiquem desenquadrados da exigência de capital mínimo.
De acordo com o Relatório de Estabilidade Financeira de novembro, que divulgou os resultados do teste de junho, as instituições se mostraram menos sensíveis às variações do câmbio do que às de outros fatores de risco. Com posições líquidas vendidas na época, os bancos tinham o índice da Basileia aumentado quando a taxa de câmbio caia.
Variações nas taxas de juros também não tornaram nenhuma instituição insolvente, embora um “conjunto representativo de instituições tenha ficado desenquadrado nos cenários mais extremos”. O teste do BC também verificou que variações positivas e negativas na taxa de juros “parecem afetar o índice da Basileia de forma semelhante”. Mas, acrescenta o relatório, “o fato de as instituições possuírem, na média, posições líquidas compradas em juro prefixado, fez com que os aumentos das taxas tivessem um impacto maior sobre o patrimônio das instituições”.
De acordo com relatório do BC, com o aumento do crédito, a capitalização dos bancos, também chamada de índice de Basileia, uma referência à cidade suíça onde fica a sede do Banco para Compensações Internacionais (BIS), caiu, mas continuou suficiente para cobrir os ativos ponderados pelo risco e o aumento da inadimplência. A rentabilidade do patrimônio ficou acima da média de outros países, em decorrência da queda das despesas administrativas e da ativação de crédito tributário.
Os testes de estresse são feitos regularmente nas instituições brasileiras pelo BC, desde 2000. Os resultados começaram a ser divulgados em 2003, duas vezes por ano, com base nos balanços de junho e de dezembro.
Os testes são uma ferramenta de supervisão bancária, recomendada pelo BIS aos bancos centrais do mundo todo. Cada país tem sua metodologia. Não há um padrão comum, embora existam algumas diretrizes básicas e um manual de procedimentos editado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial, o Financial Sector Assessment Program (FSAP).
A orientação é “estressar” os principais riscos de cada país. No Chile, por exemplo, avalia-se o impacto da oscilação das commodities. Nos Estados Unidos, os bancos estão sendo testados levando-se em conta o aumento do desemprego e a queda do preço dos imóveis. Os testes são obrigatórios para os bancos com ativos superiores a US$ 100 bilhões com o objetivo de verificar se necessitarão de mais capital. O foco está sendo dirigido para as carteiras não marcadas a mercado, com o objetivo de dimensionar perdas potenciais além do horizonte de 12 meses.
No Brasil, o teste é aplicado banco a banco. Mas apenas as informações agregadas são divulgadas. No próximo teste, novos fatores de risco foram incluídos na metodologia: oscilações bruscas das commodities, ações, cupom cambial e inflação entre outros fatores. Fontes do Banco Central negaram que a ampliação dos testes seja resultado da crise internacional. Atribuíram a mudança às novas regras do acordo de capital mínimo dos bancos, chamado de Basileia 2.
De acordo com o relatório, os testes do BC compreendem duas análises distintas para verificar o impacto sobre o índice da Basileia em cenários de oscilação das taxas de juros prefixadas e de câmbio – risco de mercado – e de rebaixamento na classificação de risco de todas as operações de crédito – risco de crédito.
Uma das análises é temporal, isto é, busca apurar como o índice de Basileia reage ao longo do tempo à aplicação de cenários extremos. Foram aplicados choques nas posições dos bancos de janeiro de 2004 a junho de 2008, correspondentes às maiores variações percentuais das taxas de juros e de câmbio ocorridas no período e ao rebaixamento de dois níveis na classificação de todas as operações de crédito.
Os cenários foram combinados em quatro alternativas: aumento do risco de crédito (I), aumento dos juros e do câmbio (II), aumento dos juros, do câmbio e do risco de crédito (III) e redução de juros e de câmbio (IV).
A outra análise é chamada de sensibilidade e avalia o efeito isolado sobre o índice da Basileia de aumentos nas provisões, nos juros e no câmbio na posição de junho de 2008. Essa análise afere possibilidade de insolvência técnica (patrimônio líquido negativo) e desenquadramento em relação ao capital mínimo exigido. Como explicou uma fonte, o teste de sensibilidade mede o que cada banco suporta.
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Fonte:Valor Econômico