Balanços das grandes instituições financeiras preveem desaceleração nos empréstimos neste ano devido à crise
Diante da possibilidade de aumento do desemprego, bancos também elevaram seu patamar das provisões contra futuros calotes
FABRICIO VIEIRA
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Após um 2008 ainda bastante vigoroso para o setor bancário, 2009 promete ser bem mais complicado. Esfriamento na concessão de crédito, risco de aumento na inadimplência, economia em desaceleração: o cenário esperado para este ano não é dos mais animadores para as instituições financeiras.
O crédito cresceu ao ritmo de 34% no ano passado, atingindo R$ 977,84 bilhões, segundo levantamento realizado pela Austin Rating com 27 instituições financeiras. Para este ano, os próprios bancos têm projetado crescer menos da metade disso. No último trimestre de 2008, as instituições financeiras já sentiram os primeiros reflexos da crise, com a desaceleração na oferta de crédito.
O Bradesco, por exemplo, prevê crescimento entre 13% e 17% em sua carteira de crédito neste ano. O banco viu sua carteira aumentar 40,8% no terceiro trimestre de 2008 (considerando 12 meses). No quarto trimestre, o ritmo de crescimento em 12 meses diminuiu para 33,4%.
Para o Banco do Brasil, a previsão é que o crédito se expanda em aproximadamente 17% em 2009. Em 2008, o crescimento de sua carteira de crédito alcançou 39,9%.
Um dado que se destacou nos balanços dos bancos em 2008 foi o aumento das provisões. Temerosos em relação aos riscos da ampliação da inadimplência, os bancos optaram por fazer elevada provisão adicional para perdas com crédito duvidoso. Em outras palavras, reservaram mais recursos para cobrir eventuais perdas. Com isso, o saldo das provisões cresceu 46% no ano passado -ritmo maior do que o das carteiras de crédito.
“Chama a atenção o aumento das provisões no final do ano passado. Mostra no balanço de dezembro a realidade de 2009, que será de [expansão do] crédito menor, maior inadimplência, lucro menor, eventual ajuste de estrutura e demissões. Os números de março vão deixar mais nítida essa realidade”, afirma Luis Miguel Santacreu, analista de bancos da Austin Rating.
Apesar de ainda bilionário, o lucro líquido dos bancos teve expansão menos vigorosa em 2008. O estudo mostra que o lucro líquido desses 27 bancos aumentou 7,8%, totalizando R$ 37,29 bilhões.
“Se você pegar a trajetória de resultados e comparar o quarto trimestre com o terceiro, houve queda no lucro líquido recorrente por motivos óbvios. A crise internacional encaminhou uma pressão de “funding” [captação] muito grande. A dinâmica do crescimento da carteira de crédito foi diminuída e aumentaram os provisionamentos”, diz João Augusto Salles, da consultoria Lopes Filho. “O quadro que se traça para 2009 é de muita incerteza. E isso machucou a margem financeira para os bancos”, completa.
Segundo pesquisa divulgada na semana passada pelo Banco Central, os bancos têm razão em se preocupar com a inadimplência. Em janeiro, os pagamentos atrasados há mais de 90 dias, no segmento de pessoa física, alcançaram 8,3% da carteira de crédito dos bancos, sendo esse o maior percentual desde maio de 2002. Em dezembro, a inadimplência estava em 8%; em junho, em 7%.
“O primeiro trimestre está sendo assim e nada aponta para que ocorra o contrário disso nos próximos meses. Tem pessoas dizendo que [o crédito] pode melhorar no segundo semestre. Pode melhorar, mas pode piorar também. Há um grau de incerteza muito grande. Qual o problema de 2009? É o desemprego e a inadimplência. Os bancos vão ter de trabalhar mais para emprestar melhor. Já estão sendo muito mais seletivos, exigindo mais garantias e, mesmo assim, estão aumentando o provisionamento”, avalia Salles.
Tarifas
Paralelamente, houve uma estagnação das receitas com prestação de serviços (como tarifas e taxas cobradas de contas, cartões e mesmo de fundos de investimento) ao longo do ano passado. Isso ocorreu devido ao impacto das novas regras criadas pelo Banco Central para a cobrança de tarifas, que entraram em vigor no ano passado.
De acordo com o levantamento da Austin Rating, a receita de serviços dos 27 bancos pesquisados passou de R$ 52,874 bilhões para R$ 56,835 bilhões -expansão de 7,6%, praticamente igual à inflação e à expansão da base de clientes do negócio bancário.
No caso do Bradesco, a contribuição do setor de serviços bancários para o seu resultado caiu de 29% do total em 2007 para 26% em 2008.
Para os ganhos com os serviços bancários voltarem a crescer e conseguirem compensar a esperada perda com o crédito, os bancos terão de apostar no aumento de sua base de clientes, avaliam analistas. Nesse quesito, os bancos não têm muitas restrições, pois o simples fato de abrir uma conta, emitir um cartão e cobrar por esses serviços não traz riscos extras para as instituições financeiras.
“O espaço para a expansão do crédito no Brasil ainda é elevado. Mas os bancos estão mais cautelosos em relação ao cenário econômico. A expectativa para 2009 é realmente de um crescimento menor no crédito”, afirma Guilherme Ralisch, analista financeiro do Inepad (Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração). “Algum crescimento na inadimplência já tem sido notado. Mas não acredito que haja uma deterioração muito grande nesse sentido”, avalia Ralisch.
Bancos pequenos
Os resultados apresentados em 2008 mostraram também a deterioração da situação dos bancos pequenos, que tiveram mais dificuldades para captar recursos e manter o mesmo ritmo de crédito.
Apesar da menor captação, a maioria desses bancos com ação na Bovespa fechou o ano no azul -BIC, com R$ 321 milhões de lucro; Panamericano, R$ 236 milhões; Daycoval, R$ 300 milhões; Pine, R$ 133 milhões; Indusval, R$ 72 milhões; e Paraná, R$ 84 milhões.
02/03/2009
Bancos reduzem à metade previsões de expansão do crédito
Folha de S.Paulo
Fonte:Folha de S.Paulo